O mercado de multipropriedade tem sofrido muito com demandas trabalhistas ajuizadas por corretores em face das comercializadoras, e, também, das SPE’s, direcionadas para esse tipo de produto.
Como sabemos, para que haja a configuração de emprego são necessários 5 requisitos essenciais, indispensáveis e cumulativos, quais sejam: ser uma pessoa física, pessoalidade, não eventualidade, onerosidade e subordinação. Sem ao menos um desses requisitos podemos até ter trabalho, mas não temos, de forma alguma, emprego. Nesse sentido existe, inclusive, uma máxima que diz: todo emprego é um trabalho, mas nem todo trabalho é um emprego.
A jurisprudência trabalhista está bem sedimentada em relação ao entendimento de que o corretor de imóveis é um profissional autônomo, sem vínculo empregatício. Assim vem sendo o entendimento quando a relação se dá em parceria com uma imobiliária que vende produtos de incorporações convencionais. Até por conta da tese muito bem explorada e consolidada em vários tribunais regionais do trabalho, conhecida como mais-valia. Ou seja, não há empregado no mundo que ganhe cerca de 30% do que o seu suposto empregador ganha, assumindo este último os riscos do negócio. Na verdade, o corretor é um sócio daquela venda realizada, tendo em vista o percentual por ele ganho.
Mas, na multipropriedade, por vezes o entendimento jurisprudencial tem sido diferente, já que o modelo utilizado pelas comercializadoras é, também, diferente. Normalmente, os corretores ficam dentro de uma sala de vendas apenas, sem que o potencial cliente seja atendido em outros lugares ou imóveis, o que o pretenso empregado acaba explorando no ajuizamento das ações. Reclamam também das famosas comissões canceladas, entre outros fatores que, por falta de organização e padronização de documentação do próprio mercado, por vezes tem gerado procedências em ações trabalhistas, de pedidos de vínculos empregatícios de corretores de imóveis, que na verdade são autônomos prestadores de serviços.
É necessário que o mercado tenha a padronização devida, com a utilização de carta proposta, assinatura de contratos de intermediação de venda e compra de quota imobiliária, entre outros. É necessário que haja a assinatura por parte das comercializadoras e dos corretores parceiros, do contrato de corretor associado, com base na Lei Federal n. 6.530/78, em seu art. 6º, parágrafo 2º, e que, principalmente, não haja a onerosidade. Quem paga a comissão é o comprador da quota, jamais a comercializadora. O que pode acontecer é o repasse da comissão pela comercializadora, a fim de respeitar a possibilidade de cancelamento em 7 (sete) dias, prevista na conhecida Lei dos Distratos, 13.786/18.
Dentro desses 7 (sete) dias, caso haja desistência, seguindo os critérios da Lei pertinente, a comissão também deve ser devolvida.
O mercado de multipropriedade está sofrendo com ações trabalhistas milionárias, com base em pedidos de reconhecimentos de vínculos empregatícios de corretores que, na verdade, não buscam um reconhecimento de vínculo. Na realidade, não abrem mão de serem autônomos na prática, mas buscam perante a justiça um enriquecimento sem causa, ou, o que conhecemos como enriquecimento ilícito. E se o mercado não agir e criar as práticas adequadas com as assessorias certas nesse sentido, irá dar muita munição e cada vez mais engajamento para ações com esse perfil.
Há várias maneiras de se provar que não há vínculo empregatício entre as partes citadas, mas para isso deve haver um alinhamento entre comercial e administrativo da empresa, onde não se deve pensar apenas na venda de hoje, mas também na ação trabalhista de daqui a 2 ou 3 anos. A operação deve ser pensada no todo e não simplesmente na venda mês a mês.
- Diego Amaral é sócio do escritório Dias & Amaral Advogados Associados, diretor da Comissão Nacional de Direito Imobiliário do CFOAB, Conselheiro Jurídico da CBIC, Conselheiro Jurídico da ADEMI/GO, Ex-Presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB/GO (2016/2018 – 2019/2021), professor de pós-graduação em Direito Imobiliário, autor e palestrante.