O setor de multipropriedade no mercado imobiliário tem enfrentado desafios significativos relacionados ao reconhecimento do vínculo empregatício, especialmente no que tange aos operadores de sala de vendas. Durante muitos anos, a interpretação dominante entre os tribunais era de que esses profissionais se enquadravam na definição de empregados, conforme o artigo 3º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Essa visão resultou em condenações que impactaram severamente as finanças das empresas do setor.
Recentemente, no entanto, um novo cenário se impôs, impulsionado por uma advocacia especializada que tem conseguido reverter diversas reclamações trabalhistas, evidenciando a eficácia de uma orientação legal robusta. O nosso escritório, em particular, tem obtido decisões favoráveis em diversas praças trabalhistas do Brasil, destacando a importância de estratégias jurídicas bem planejadas para mitigar os riscos associados ao reconhecimento de vínculos empregatícios.
Os contratos de prestação de serviços nesse segmento são frequentemente estabelecidos por meio de Pessoas Jurídicas (PJs), visando caracterizar relações de trabalho autônomas. Contudo, a jurisprudência anterior frequentemente interpretava essas relações como tentativas de ocultar vínculos empregatícios. Baseando-se em normas como o artigo 9º da CLT e na Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), muitos juízes desconsideravam os contratos, reconhecendo a existência de vínculo empregatício, fundamentando-se em elementos como subordinação e habitualidade.
A subordinação é tradicionalmente caracterizada pelo controle sobre a jornada de trabalho e pela imposição de metas, enquanto a habitualidade se refere à regularidade e carga horária estabelecida pela gestão. Esses fatores foram frequentemente determinantes para a caracterização de vínculos empregatícios.
Entretanto, decisões recentes, como a ADPF nº 324 e o Tema 725 do Supremo Tribunal Federal (STF), transformaram essa dinâmica. O STF, ao decidir sobre a legalidade da “pejotização”, reafirmou a possibilidade de contratos de prestação de serviços que não configuram vínculo empregatício, desde que respeitados os limites legais. O Tema 725 estabelece que a Justiça do Trabalho não possui competência para julgar ações que pleiteiem o reconhecimento de vínculo empregatício quando existe um contrato formal de prestação de serviços, transferindo essa competência para a Justiça Comum Cível.
Sentenças recentes, como a da 1ª Vara do Trabalho de Campo Grande (MS), processo nº 0012345-67.2024.5.24.0001, demonstram essa nova orientação ao afirmar que a “pejotização”, ou a prestação de serviços por meio de pessoa jurídica, é lícita, desde que não haja fraudes que descaracterizem a relação contratual. A juíza Dra. Déa Marisa Brandão Cubel Yule destacou que a ausência de subordinação jurídica, característica essencial da relação de emprego, foi evidenciada, resultando na improcedência do pedido de reconhecimento de vínculo.
Outro exemplo relevante é a decisão da Vara do Trabalho de Goianinha (RN), processo nº 0000559-47.2024.5.21.0020, que também ressaltou a incompetência da Justiça do Trabalho para tratar de questões relacionadas a vínculos empregatícios quando há um contrato de prestação de serviços. A corte reconheceu que a prestação de serviços pode ocorrer de forma diversa da relação de emprego tradicional, assegurando a liberdade empresarial e a autonomia das partes.
O acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região, em processo nº 0010125-03.2023.5.18.0161, reafirmou a legalidade das relações de trabalho distintas das aquelas regidas pela CLT, enfatizando que a Justiça do Trabalho deve respeitar as alternativas de organização empresarial, permitindo que as empresas contratem prestadores de serviços sem que isso implique automaticamente em vínculos empregatícios.
Diante desse novo contexto, a importância de uma assessoria jurídica competente se torna evidente. A elaboração de contratos claros e adequados, que respeitem as normas vigentes e as orientações da jurisprudência, é fundamental para que as empresas do setor de multipropriedade operem de forma segura. Isso não apenas protege a viabilidade financeira, mas também fortalece a reputação das empresas, permitindo uma atuação focada em crescimento e inovação.
Assim, a transformação nas interpretações jurídicas, aliada a práticas contratuais adequadas, abre novas oportunidades para a proteção legal e o fortalecimento do setor imobiliário, permitindo que as empresas operem com liberdade e segurança em um mercado em constante evolução. O fim da “farra dos reclamantes” no setor de multipropriedade marca um novo capítulo para as empresas do segmento, que podem agora operar com mais segurança e clareza em suas relações de trabalho.
- Diego Amaral é advogado com 25 anos de experiência no Mercado Imobiliário, Conselheiro Jurídico da CBIC, Conselheiro Jurídico da ADEMI/GO, Ex-Presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB/GO (2016/2018 – 2019/2021), Ex-Diretor da Comissão Nacional de Direito Imobiliário do CFOAB, professor de pós-graduação em Direito Imobiliário, autor e palestrante.