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Como superar o gargalo da mão de obra qualificada

* Artigo de Francisco Costa Neto e Samuel Goldstein

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Francisco Costa Neto e Samuel Goldstein

A escassez de mão de obra qualificada é um problema enfrentado pela multipropriedade imobiliária, setor de atividade turística atualmente com cerca de 200 projetos em andamento no país e crescimento acima de 20% desde 2020. A cadeia turística é estratégica para a geração de empregos. O setor de turismo nacional emprega 3 milhões de pessoas e, só no mês de março de 2023, foi responsável por uma em cada dez vagas criadas no Brasil, segundo dados do Ministério do Trabalho.

Com toda a importância que representa para o crescimento econômico do país, por sua capilaridade em geração de emprego e de renda, o setor ainda assim se depara com o gargalo da falta de capacitação de mão de obra. A consultoria Caio Calfat estima uma expansão de quase 30% para 2023 desse mercado de multipropriedade imobiliária, que não encontra trabalhadores aptos a preencher as vagas abertas atualmente e as que ainda serão criadas nos projetos em andamento no Brasil.

A indústria do turismo compartilhado é um grande empregador, pois abrange uma ampla e variada gama de atividades em suas diversas etapas de funcionamento, que vão de atendimento ao cliente, alimentação e bebidas, vendas, marketing, construção civil entre outras.

Um único empreendimento é capaz de gerar 4 mil empregos diretos e indiretos entre a comercialização, obras e operação. Este é o caso do Village Itaparica, que será erguido na Ilha de Itaparica, exatamente no mesmo local onde funcionou o Club Med. A estimativa considera o número de trabalhadores envolvidos na fase de construção e de operação do Village Itaparica, que terá 443 apartamentos de veraneio, beach club e shopping a céu aberto. Com isso, o Village Itaparica, que desde a fase inicial do projeto conta com a assessoria da Beta Advisory, será o maior empregador da Ilha e o maior pagador de impostos, como foi o Club Med por 40 anos.

Nas salas de vendas espalhadas pelo país trabalham mais de 5 mil pessoas, segundo levantamento realizado em 2022 pelo Turismo Compartilhado e a Mapie Consultoria, com 70% dos empreendimentos listados.  Cada sala de vendas emprega, em média, 30 pessoas, entre vendedores e gerentes. Circulam ainda estimativas indicando que somente o segmento de pós-venda emprega por volta 8 mil pessoas.  Esses números ajudam a dar uma ideia do alcance e do efeito multiplicador da multipropriedade em termos de mão de obra.

Diante de tal cenário, o prognóstico para muitos é de que a expansão do mercado poderá ser comprometida nos próximos anos por causa da falta da mão de obra. Uma análise com maior distanciamento, porém, levando em conta as fases vividas até aqui e os ciclos de maturação do setor em outros países, pode resultar em uma conclusão diferente.

Embora esteja associado à carência educacional brasileira, a escassez de profissionais qualificados também se deve ao rápido avanço da multipropriedade, cujo crescimento não veio acompanhado na mesma velocidade pela capacitação e qualificação dos talentos envolvidos na operação dos projetos.

É uma indústria ainda muito recente no Brasil, que começou a ensaiar seus primeiros passos em 1999, e ainda não está consolidada. À medida em que o mercado estiver estabelecido, o que deve demorar ainda uns cinco anos, os poucos grupos que permanecerem no mercado terão condições de oferecer treinamento e capacitação em larga escala. Atualmente, o setor é muito pulverizado – são mais de 100 empreendedores dos mais variados portes -, o que acaba dificultando a formação profissional em larga escala.

Village Itaparica

Os primeiros exemplos da adoção dessa prática, em que empresas assumem a responsabilidade pela preparação dos seus trabalhadores já aparecem. É o caso do Village Itaparica, que está desenvolvendo uma agenda conjunta com órgãos públicos e instituições especializadas para capacitação de mão de obra local e identificação de talentos na Ilha para atuar na administração hoteleira. Afinal, quanto mais qualificado o funcionário, melhor vai ser o serviço prestado e maiores são as chances de sucesso do negócio.

Outras empresas também optaram pelo caminho mais curto, passando a oferecer cursos de qualificação e treinamento por conta própria para suprir deficiências de aprendizado e de comportamento.  Detentora das marcas Hot Park, Rio Quente Resorts e Costa do Sauipe, a Aviva criou há cerca de dois anos um projeto educacional para desenvolver talentos internos com foco nas fases do negócio (prospecção de cliente, vendas, fidelização, relacionamento, promoção e marketing).

Entre as principais carências dos candidatos a emprego estão o baixo grau de instrução e dificuldade de aprendizagem para desempenhar funções básicas como recepcionista, arrumadeira, camareira, garçom, sem falar na dificuldade em assimilar o avanço cada vez mais rápido das novas tecnologias e a falta do idioma inglês.

Há ainda lacunas no conhecimento de regras de etiqueta social e de comportamento. É preciso treinar, por exemplo, a forma correta de abrir uma garrafa de água, como se portar durante uma venda, noções de etiqueta à mesa e como atender o telefone, atividades corriqueiras e essenciais para quem se relaciona diretamente com o hóspede.

Os cursos oferecidos pelas empresas ensinam desde como abrir o copinho de água, questões relacionadas a diversidade e inclusão e até mesmo os nomes das capitais dos estados brasileiros (o profissional que atua na recepção precisa preencher o cadastro do hóspede e a empresa identificou que geografia é um ponto fraco). Ministradas toda semana por diferentes professores, como pílulas, as aulas contribuíram para reduzir o turnover em cerca de 2% desde seu início, aumentar as vendas e o engajamento.

As experiências bem-sucedidas mostram que o desenvolvimento sustentável do mercado de multipropriedade e o sucesso dos empreendimentos dependem do compartilhamento de conhecimento e do estímulo a formação profissional.

* Francisco Costa Neto é Managing Partner na Beta Advisory www.betaadvisory.com.br. Foi CEO da Aviva, detentora das marcas Hot Park, Rio Quente Resorts e Costa do Sauipe. Com formação em finanças pela Universidade de Vermont e curso Owners Presidents Program (OPM) na Harvard Business School, Neto já atuou na área de telecomunicações e em banco de investimentos.

*Samuel Goldstein é CEO da Eindom Empreendimentos, responsável pelo Village Itaparica. Formado em administração de empresas com especialização em finanças pela  FGV e curso LNV na Harvard Business, ele fundou uma série de empresas no Brasil nos segmentos de bebidas, consultoria e imobiliário.

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